Peçonha da Polybia occidentalis pode ter efeitos em crise epiléptica (Foto: Carlos Eduardo Joos/Wikipedia/Creative Commons Attribution 2.0 Generic)
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Cientistas da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto estudam o potencial de uma molécula extraída do veneno de vespas em tratamento da epilepsia. Os testes apresentaram resultados positivos em camundongos e a molécula agora é uma promessa para bloquear ações de substâncias nocivas aos neurônios.
O efeito dos venenos e peçonhas das vespas intrigaram os pesquisadores porque a picada desses insetos paralisa as suas presas. Assim, então, pensaram na hipótese da ação da mesma substância no cérebro humano, com a possibilidade de reduzir as crises epilépticas. Os insetos testados na pesquisa são as vespas Polybia occidentalis, conhecida como marimbondo-estrela, e típica do Cerrado.
Através delas, os cientistas chegaram a molécula occidentalina-1202. Então, o resultado dos teste em animais apontaram a eficácia do veneno das vespas na proteção das células nervosas do cérebro, sem efeitos colaterais, que é o problema dos farmascos atuais no tratamento da epilepsia.
Processo de extração do veneno
A pesquisa está publicada na Brain Communications. O resultado indica que a occidentalina-1202 atravessa a barreira hematoencefálica responsável pela proteção do cérebro contra substâncias nocivas no sangue e bloqueia a ação do cainato no cérebro. O cainato é uma toxina já utilizada para induzir crises epilépticas em animais.
O professor Wagner Ferreira dos Santos, do Departamento de Biologia da USP, explicou que a ação na prática. “A occidentalina-1202 é capaz de bloquear a ligação do cainato nos seus receptores, inibindo a continuação desta cascata lesiva, causando a neuroproteção”, disse.
O processo de extração do veneno começa com a captura e consequentemente congelamento das vespas fêmeas. Então, depois, o veneno é extraído e purificado, e posteriormente separado entre partes menores para verificar quais partes possuem as propriedades medicinais. Após a purificação completa do veneno, o composto com efeito antiepiléptico é extraído e é gerada uma cópia quimicamente modificada, tendo como resultado a occidentalina-1202(s). A occidentalina-1202 é assim um produto sintético.
Testes
Para os testes, os cientistas induziram epilepsia aguda por ácido caínico nos animais e, em seguida, utilizaram a molécula sintética occidentalina-1202(s) como dose terapêutica. Com isso, os pesquisadores observaram a eficácia da molécula na redução da crise epiléptica e analisaram os efeitos colaterais da substância.
Desta forma, então, chegou-se ao resultado promissor em que a occidentalina-1202(s) ajuda a controlar a atividade elétrica excessiva no cérebro e, portanto, tem potencial para reduzir as convulsões epilépticas.
“Estamos realizando todos os testes necessários para determinar a segurança do uso desse composto, utilizando uma série de ensaios de toxicidade e de determinação de efeitos adversos”, disse a pesquisadora Márcia Mortari, professora do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Brasília (UnB).
Avanço da ciência
O estudo é mais um avanço da ciência para melhorar a qualidade de vida das pessoas. A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que a epilepsia atinge cerca de 50 milhões de pessoas em todo o mundo. Os fármacos atualmente disponíveis para o tratamento são eficazes, mas geram uma diversidade de efeitos colaterais.
A OMS destaca de questões mais comuns como sonolência e tontura a problemas mais complexos como sedação, problemas de memória e danos à medula óssea e ao fígado. Mortari acredita que é um ótimo início para novos medicamentos que interagem com o sistema nervoso central. “São moléculas com grande atividade e seletividade, e, por isso, possuem efeitos adversos menores”, contou.
Os cientistas contaram que os peptídeos não são novidade na medicina medicamentosa, pois são a fonte para remédios como o analgésico ziconotide, usado no controle da dor causada por câncer e/ou AIDS, e que é desenvolvido a partir de um peptídeo de um caracol marinho natural das Filipinas. Além desse caso, tem o captopril, medicamento para pressão arterial criado a partir do peptídeo de veneno da Bothrops jararaca, uma cobra brasileira.
“É uma oportunidade de entendermos os mecanismos fisiológicos e bioquímicos que operam em diferentes organismos, inclusive em doenças, e assim desenvolver remédios”, disse. Os testes continuam em andamento.
*Este conteúdo está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU). Nesta matéria, o ODS 03 – Saúde e bem-estar.
Publicado em 28/03/2024